segunda-feira, 30 de novembro de 2009

A CASA DO COSME VELHO (1)

       


Casa do Cosme Velho, 18
Nesta residência, Machado de Assis e Carolina
viveram grande parte da vida.

          Machado de Assis e Carolina já moravam há alguns anos na rua do Catete, quando o proprietário do imóvel pediu a casa. De uma hora para outra, o casal viu-se novamente obrigado a mudar de residência. Já estavam acostumados àquela moradia pequena, mas aconchegante, com grandes janelas na parte da frente, através das quais os transeuntes podiam ver o escritor e sua esposa conversando na sala.
          Com a morte de Rodrigo Pereira Felício, a Condessa de São Mamede, Joana Maria, herdara uma bela chácara nas Laranjeiras. Decidiu lotear sua propriedade e mandou construir no terreno quatro chalés, que ela resolveu alugar. Ao saber que Machado de Assis e Carolina estavam procurando uma nova casa, a condessa ofereceu-lhes o seu imóvel. A princípio, Joaquim Maria esteve para recusar a proposta, pois imaginava que não teria condições de arcar com o custo do aluguel naquele bairro elegante, mas Joana Maria afirmou que lhes cobraria a mesma importância que eles pagavam em sua residência anterior. Assim sendo, no início de 1884, o casal mudou-se para a rua do Cosme Velho, 18, onde permaneceria até o final da vida.
          Era uma ruazinha sossegada, bem ao gosto do escritor. O único inconveniente é que ela ficava um pouco longe do centro da cidade, para onde Machado teria de ir diariamente, tomando o bondinho das “Águas Férreas”. Diante de sua casa, havia um riachinho, ladeado por um pequeno muro de pedra. Era aí que ficava a famosa Bica da Rainha, onde dona Carlota Joaquina costumava vir lavar seu rosto, pois corria pela cidade a lenda de que tais águas tinham certas propriedades miraculosas, capazes de transformar em mulheres belíssimas aquelas que haviam sido pouco ajudadas pela natureza.

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

A CASA DO COSME VELHO (2)

          Entremos, pois, na casa do escritor. Ao abrirmos o portão de ferro, alto e de grade, a primeira coisa que nos chama a atenção é o jardim, com diversas plantas e até algumas árvores, onde os pássaros cantam livres, pois Machado nunca os quis ter em gaiolas. Do lado esquerdo de quem entra, está enterrada a cadelinha Graziela, companheira fiel do casal por tantos anos. No primeiro andar, vemos duas janelas, ladeando a porta de entrada, que dá para a sala de visitas. Este é o único ambiente da casa que o escritor permite que seja freqüentado pelos amigos. O restante da moradia, nem os mais íntimos conheciam. Poucos móveis compunham o mobiliário da sala: um sofá, uma mesinha, cadeiras e alguns quadros, como o de Beatriz e Dante, além de alguns retratos de amigos: Joaquim Nabuco, Salvador de Mendonça e Magalhães de Azeredo. Também se encontravam emoldurados algumas folhas secas, relíquias que os companheiros de letras lhe mandavam de presente ao viajarem para o exterior: as folhas do salgueiro que deitavam sombra sobre o túmulo de Musset e o ramo do carvalho de Tasso, que seria entregue a Machado numa das reuniões da Academia Brasileira de Letras.
          Além da sala de visitas, havia ainda no andar de baixo uma espaçosa cozinha, uma saleta, onde Carolina costumava costurar e bordar e uma varanda que saía para o quintal. No andar de cima, três amplas janelas davam para o jardim. O quarto era voltado para a frente e possuía, além de uma grande cama de casal, alta e larga, uma cômoda com espelho. Havia também um quarto pequeno, que era utilizado para vestir, com guarda-roupa, lavatório e cômoda. Ao lado, ficava o escritório de Machado de Assis, onde ele escreveu grande parte de suas obras-primas. Era a única parte da casa que Carolina tinha ordens expressas de não arrumar nada. O escritor estava acostumado com aquela bagunça, com seus livros, jornais, brochuras, tudo espalhado e misturado por toda parte. Uma das portas do escritório dava acesso a uma varanda, com vista belíssima, mas Joaquim Maria pôs diante dela um enorme armário envidraçado. Isto demonstra bem que ele nunca teve uma grande sensibilidade visual. Poderia buscar inspiração admirando as montanhas, mas preferia a reclusão de seu gabinete.
          A casa do Cosme Velho custava ao casal a importância de cento e trinta mil réis mensais. Por toda sua vida, Machado de Assis nunca teve casa própria, embora possuísse recursos para adquirir um imóvel, caso desejasse.



Escrivaninha de Machado de Assis,
onde ele escreveu grande parte de sua obra.

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Machado e a Monarquia 1

          E como Machado de Assis teria visto a proclamação da república? Embora ele nunca tenha se expressado claramente a este respeito, sabe-se que o escritor via a monarquia de maneira simpática. Tinha grande admiração por D. Pedro II e chegara mesmo a freqüentar o paço imperial algumas vezes, como prova a sua assinatura no livro de presenças. Se exultou com a abolição dos escravos, não aconteceu o mesmo ao receber a notícia de que a república havia se instalado no país. Em seu íntimo, estava convencido de que a monarquia parlamentarista era o regime ideal e nunca acreditou no presidencialismo à maneira americana. Na verdade, sabia que pouca serventia teria a mudança de regime, uma vez que os políticos que disputavam o poder eram sempre os mesmos. Para Joaquim Maria, estava claro que os graves problemas nacionais não seriam resolvidos apenas com o advento da república.
          Se durante sua juventude Machado de Assis demonstrava certa tendência liberal, com a maturidade o seu temperamento foi se tornando cada vez mais conservador, explicado em parte por suas funções no Ministério, que exigiam discrição em suas opiniões. Não é que ele fosse contra a república, mas imaginava que o novo sistema pudesse descambar para a anarquia, alterando a rotina de seus hábitos. Depois que encerrou em agosto de 1889 a sua coluna “Bons Dias!” na Gazeta de Notícias, ausentou-se dos jornais durante algum tempo, como se estivesse traumatizado com o golpe da república. Quase nada escreveu a respeito, assistindo com certa antipatia o afastamento de D. Pedro II. Apenas registrou de maneira humorística estes eventos no Esaú e Jacó, no célebre episódio em que o proprietário de um estabelecimento comercial não sabia o que escrever na tabuleta de sua loja, se confeitaria do império ou da república.



Paço Imperial,
freqüentado por Machado de Assis algumas vezes.

terça-feira, 10 de novembro de 2009

Machado e a Monarquia 2

        
          Um episódio muito curioso, narrado por quase todos os biógrafos do escritor, é o que diz respeito à retirada de um retrato de D. Pedro II, que estaria pendurado numa das paredes de sua diretoria. Segundo a lenda, mal fora proclamada a república, alguns funcionários simpáticos ao novo regime vieram retirar o retrato do local em que ele havia permanecido por longos anos. Consta que Machado de Assis não permitiu a sua remoção, dizendo: “Entrou aqui por uma portaria, só sairá por outra portaria”.
          Ora, estas supostas palavras colocadas na boca de Joaquim Maria levaram alguns estudiosos mais afoitos a acusá-lo de bajulador. Nada mais falso. Machado de Assis gostava de fato de D. Pedro II e, durante toda sua vida, jamais escreveu qualquer palavra contra o imperador. Apesar de seus sentimentos monarquistas, aceitou a república como um fato consumado, como o Barão do Rio Branco, Joaquim Nabuco e tantas outras personalidades da época. Além do mais, o escritor não poderia ter dito aquelas palavras, pois toda gente sabe que retratos não são pendurados em paredes através de portarias...



Dom Pedro II, por quem Machado de Assis
tinha grande admiração.

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

FAUSTINO XAVIER DE NOVAIS (1)



      Faustino Xavier de Novais nasceu na cidade do Porto, a 17 de fevereiro de 1820. Filho de Antônio Luís de Novais e Custódia Emília Xavier de Novais (sogros de Machado de Assis), era o filho mais velho das seis crianças que o casal gerou: Faustino, Miguel, Henrique, Adelaide, Emília e Carolina, a caçula. Recebeu apenas instrução elementar, tendo sido autodidata. Aos oito anos já compunha versos. Trabalha na loja de seu pai como relojoeiro e ourives e, depois, emprega-se no Banco Mercantil Portuense. Com o pseudônimo de Saturno, escreve no Periódico dos Pobres do Porto (não confundir com o jornal homônimo, publicado no Brasil, onde Machado publicou seu primeiro soneto). Entre 1852 e 1853, encontramos Faustino dirigindo a revista literária O Bardo, que se caracterizava pela sátira violenta e pela zombaria mordaz. É provável que por causa dessas sátiras tenha sido obrigado a deixar o Porto e vir para o Brasil, embora Camilo tenha dito que ele fugira para o Rio de Janeiro por causa de “um amor baixo, ignóbil até a miséria.” Seja como for, chegou aqui já casado, pois aos trinta e cinco anos contraiu matrimônio com Ermelinda Novais, mas se sabe que o poeta não se dava com ela, que tinha mau gênio. Em 1855, ano de seu casamento, publica um livro intitulado Poesias, que recebeu boa acolhida por parte da crítica. Entretanto, morar no Porto não era fácil para um poeta satírico de língua afiada como ele, que vivia ofendendo sensibilidades e fomentando ódio e inimizades.