terça-feira, 25 de agosto de 2009

VISITA DO BARÃO DO RIO BRANCO


Um dia antes de falecer, Machado de Assis recebeu a visita do Barão do Rio Branco. O estado de saúde do escritor era crítico, mesmo assim, ao ouvir ser anunciada a presença de pessoa tão ilustre, ele se esforçou tremendamente para se sentar na cama a fim de melhor receber o companheiro de academia. Segundo Francisca de Basto Cordeiro, que também se encontrava presente, a cena gravou-se para sempre em sua memória. Com a face iluminada por um resto de vida, Joaquim Maria estendeu seus braços para receber um abraço fraternal, mas o barão esquivou-se, limitando-se apenas a lhe apertar levemente a mão. Em seguida, muito constrangido, Rio Branco disse algumas palavras breves:

“- Então o que é isto, Machado? Está melhor, não é? Amanhã voltarei a vê-lo...”

José Maria da Silva Paranhos, o Barão do Rio Branco, nem esperou pela resposta e retirou-se o mais rápido que pôde, fingindo não ver a cadeira que trouxeram para ele se sentar ao lado do moribundo. Machado de Assis caíra na cama, mortalmente ferido, humilhado, tendo sua sensibilidade sido ofendida de maneira irreparável. O escritor virou-se para a parede e mais nada falou, pois sua alma morrera naquele instante. Para completar a humilhação, todos que se encontravam no quarto ainda puderam ouvir o barão lavando as mãos num tanque que havia ali ao lado, como se temesse pegar alguma doença contagiosa. Do corredor, alguém gritou solícito, procurando ser gentil:

“- Uma toalha limpa para o Barão!”

E o escritor morreria na madrugada seguinte, desiludido com a vida e com os homens.

terça-feira, 4 de agosto de 2009

VIEIRA DE CASTRO


Machado de Assis já estava para deixar o Diário do Rio de Janeiro, quando escreveu um artigo sobre o orador português Vieira de Castro. Publicado a 22 de fevereiro de 1867, este texto foi o último que Joaquim Maria dedicou à crítica literária nesse jornal. Nascido no Porto, Vieira de Castro era um dos homens públicos mais populares de seu tempo. Em Portugal, desde cedo fez fama de orador incomparável, escrevendo notáveis discursos parlamentares. Amigo particular de Camilo Castelo Branco, escreveu-lhe a sua biografia, intitulada Camilo Castelo Branco - Notícia de Sua Vida e Obra. Machado de Assis foi assistir a uma das preleções que Vieira de Castro fez no Rio de Janeiro e ficou encantado com o que viu e ouviu:

“Antes de termos ouvido a palavra eloqüente do Sr. Dr. Vieira de Castro, apenas levados pela fama que o precedeu, fomos ansiosos escutá-lo e aplaudi-lo. Se era assim antes, muito mais será agora que já pudemos apreciar os seus raros méritos e avaliar a legitimidade de sua reputação.”

Conta Josué Montello que Machado de Assis guardava em seus arquivos uma carta que ele recebera do próprio Vieira de Castro. Pelas palavras do português, percebe-se que ele procurava demonstrar certa intimidade com Joaquim Maria:

“Meu querido Machado de Assis - Como vai você, meu adorável poeta? - Aí lhe apresento o Dr. Silveira Ferreira, notável professor da U. de Coimbra, talento elevado e clínico peritíssimo. Proteja-o com o seu grande talento e faça-lhe as honras da imprensa, sim? - Eu mando um milhão de abraços e de profundíssimas saudades ao meu querido Machado de Assis.
O seu
Vieira de Castro.”

Teria Machado de Assis apreciado estas manifestações de puro derramamento, ele que confessou não gostar de pessoas “derramadas” ou muito salientes? Além do mais, outra observação merece registro. Joaquim Maria não teria se inspirado em Vieira de Castro, que usava e abusava dos superlativos, para caracterizar anos mais tarde o José Dias de Dom Casmurro?

Seja como for, o português aqui chegou para tirar proveito de sua fama e vender aos cariocas milhares de discursos parlamentares que ele trouxe assinado. Conseguiu mais do que isso. Introduziu-se na alta sociedade do Rio de Janeiro e convenceu os pais da jovem e rica Claudina Adelaide Guimarães a tomá-la por esposa. O casal contraiu matrimônio a 28 de fevereiro de 1867, tendo sido amplamente divulgado pela imprensa. Conta-se que Vieira de Castro recebeu um enorme dote pelo casamento. Porém, não viveram felizes para sempre e o desfecho desta história de amor é dos mais trágicos. Após eles terem voltado para Lisboa, indo morar na rua das Flores, Claudina tornou-se amante de José Maria de Almeida Garrett, sobrinho do célebre poeta. Tendo Vieira de Castro descoberto o caso, planejou uma cruel vingança para lavar a sua honra ultrajada. Cloroformizou a esposa e acabou por estrangulá-la com as próprias mãos. Condenado pelo crime brutal que cometera, Vieira de Castro foi degredado para a África, onde morreu pouco tempo depois, no final de 1872, em Luanda, Angola.